terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Fréhel

Fréhel- minha devastada, devastadora Fréhel- numa sequência impressionante de Roman d'un tricheur, do Sacha Guitry. Impressionante sobretudo depois que li Conversações com Manoel de Oliveira, e numa entrevista o mestre dizia que tivera a impressão de que a moça que cantava esta canção era muito jovem, até ver que era uma senhora. E é isso mesmo: a outonal miséria do canto de Fréhel passava-nos sempre a impressão de estar no limiar da primavera; de que, sim, os homens vão continuar a corneá-la, a bebida a castigar seu fígado, os trocados a minguarem, os bares piores e as fodas nulas, o câncer vingar e o cabelo cair, sim, c'est la vie... quoi? Uma arte Irrepetível, imarcescível.

Qualquer cançoneta de Fréhel, da Java Bleu à Les amants de la Seine, esporra este paradoxo trágico: são o auto-de-fé de quem espera um mundo no próximo instante- o amante que a paquera na mesa perto do balcão, uma gorjeta na mão titubeante de um gagá, um bar menos cais e latrina Pompidour- e o Requiem de quem sabe que celebra, aqui, agora, a féerie de sua própria dissolução.

http://www.youtube.com/watch?v=Y8fhtkYKY-Q

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